Fotos: Arquivo pessoal / Reprodução

Abrir as portas de casa é abrir também um pouco da própria história. No caso de Patricia Faragone, arquiteta e dona deste apartamento de 230m² no Jardim Paulistano, em São Paulo, o Open House revela não apenas um lar, mas também uma relação afetiva com a arquitetura modernista paulistana, a arte e a memória.

Na sala de estar, uma estante desenhada sob medida para acomodar uma das paixões mais marcantes da arquiteta, os vidros, é protagonista máxima. Patricia sempre colecionou peças em viagens e, em 2023, começou a trabalhar ela mesma com o material, participando de workshops para aprender técnicas de tingimento e sopro. Desde então, a coleção ganhou ainda mais vida e se tornou parte do décor. Ali, cores e formas se multiplicam, transformando o espaço em uma verdadeira vitrine de memórias.

O mobiliário também carrega significados. A mesa de centro de vidro assinada por Lucas Requia, o rack da TV de Hugo Rodriguez, a cadeira do movimento Memphis e os tapetes curdos se unem às peças afetivas da família, como o piano de cauda Hornung & Møller, transportado com esforço até o novo endereço. Além de compor os ambientes, esses objetos dão alma ao lar.

E é por esses e por tantos outros motivos que o Open House de hoje é por esse apartamento icônico de Patricia Faragone. Você vai reparar que as paredes, persianas e elementos estruturais funcionam como pano de fundo neutro, permitindo com que cada peça, cada cor e cada lembrança ganhem destaque. O resultado é um apartamento que não se limita a refletir a arquitetura icônica de Rino Levi, mas que traduz a essência de sua moradora: alguém que transforma a vida em repertório e a casa em um mosaico de experiências, arte e memória.

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A escolha perfeita

O que era apenas um sonho em morar em um edifício icônico, que esbanjasse arquitetura e traduzisse sua formação como arquiteta, virou realidade assim que encontrou o apartamento perfeito no Edifício Gravatá, projetado por Rino Levi em 1964 – um dos grandes nomes da arquitetura moderna brasileira e com quem Patricia tinha uma forte conexão desde os tempos de faculdade. O destino ainda reservava uma coincidência curiosa: o apartamento que escolheu já havia sido ocupado por outro arquiteto, o que reforçou ainda mais o elo entre a moradora e o espaço.

Embora tenha feito pequenas alterações no layout, a verdadeira transformação veio no mobiliário e nos interiores, onde Patricia imprimiu sua sensibilidade através de peças com história. O apartamento é quase um relicário de viagens: objetos colecionados na Rússia, no Vietnã, no Japão e na Índia convivem lado a lado com achados de brechós – uma “mania” que ela considera deliciosa. Entre livros, tecidos tingidos artesanalmente e objetos de design, cada item narra uma lembrança, uma descoberta ou um momento especial.

Manifesto pessoal

Peças assinadas por designers brasileiros e estrangeiros convivem com achados de antiquário e lembranças de viagem. Há ainda móveis ressignificados, como os chineses que ganharam nova função como mesas de cabeceira. Entre objetos autorais e colecionáveis, cada escolha reflete a sensibilidade de quem tem na arquitetura e no design não apenas uma profissão, mas também uma forma de viver.

A sala abriga um dos tesouros da família: o piano Concert Grand da Hornung & Møller, que chegou ao lar quase por acaso e se tornou um símbolo de permanência. Transportado com esforço até o novo endereço, ele divide espaço com a extensa coleção de vasos de vidro em cores vibrantes, que trazem à tona uma paleta ousada. Vermelhos, laranjas, rosas e roxos marcam presença, evocando referências da estética Memphis e do trabalho de Ettore Sottsass, movimento que marcou a geração da arquiteta.

No quarto principal, o encontro entre o contemporâneo e o afetivo continua. A cama Módulo, da Futon Company, ganha vida com o enxoval delicado e as almofadas bordadas à mão por artistas brasileiros, em diálogo com objetos trazidos da China, esculturas e peças artesanais que contam histórias além das paredes do edifício.

Se o Gravatá é, por si só, um marco da arquitetura moderna em São Paulo, o apartamento de Patricia é a prova de que, quando o projeto encontra uma moradora com repertório e sensibilidade, a casa deixa de ser apenas espaço físico e se transforma em manifesto pessoal: vivo, afetivo e em constante diálogo com o tempo.